Viver é reinventar-se

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Que tal ser feliz?

Cultivar a doce paz que um dia, tão pequenos, nem sabíamos reconhecer ao respirarmos na “barriguinha”. Você lembra? Claro que não. Observe um bebê e o doce compasso de sua respiração abdominal. Você não lembra, mas com certeza, um dia, viver pra você era simplesmente respirar. Não havia pressa. Nem algo urgente a resolver. Nem metas. Não havia nada. Nem sequer havia a pretensão de existir. Apenas o existir. Sabe se lá como a vida foi ficando tão cheia de obrigações e coisas a alcançar. Já pensou em ser feliz? Milhões de vezes não é? O que está faltando? Ah, claro. Somos aqueles que temos que alcançar a felicidade e por isso só seremos felizes “quando”...ou então “se”...
Opa, espere. Quem foi que inventou isso? Foi você? Certamente você dirá que não. Tampouco fui eu. Será mesmo? Criou-se um ideal de felicidade que estamos tentados a alcançar, não hoje, pois algo tão precioso tal como a felicidade, certamente não vem embrulhada para presente do dia para a noite. Esqueceu que ouvimos desde a infância que tínhamos que lutar pela felicidade? Nossa. Uma luta sem tréguas. E só então, depois dessa grande luta, é que estaremos prontos para merecê-la. Você também acreditou nisso? Pois é. O mundo está reforçando essa teoria o tempo todo pra quem quiser ouvir. E a gente ouve. E acaba ficando surdo para os próprios sentimentos, para a realidade interior rica e bela, que quem sabe nos revelaria uma felicidade possível, real. Não uma felicidade completa nem idealizada, mas a felicidade simples que qualquer ser humano deseja, embora não saiba exatamente o que é, a não ser por breves momentos.
O ideal de felicidade apregoado nesse teatro da vida envolve diversos cenários. A criança sonha que será feliz quando for adulto e tiver sua independência. Jovens sonham que quando encontrarem alguém que os amem para toda a vida serão felizes. Outros sonham que quando tiverem casa e carro na garagem, aí sim, serão felizes. Outros dizem que serão felizes quando não tiverem mais que trabalhar e puderem gozar de tempo e tranqüilidade.
Além das questões materiais, existe uma prisão ainda mais severa: a do “ser”. É algo inconsciente e perverso, que assombra a mente de muitas pessoas, ao menos daquelas que dão significado maior à existência. É a idéia de que pra ser feliz é preciso merecer. Ser bom de verdade. Ter uma alma nobre. Ter uma série de qualidades morais elevadas é algo que se busca atingir, mas é extremamente difícil – e isso sim é uma verdadeira luta.
Para atingir uma felicidade relativa neste mundo em que vivemos temos que buscar a perfeição relativa. As situações da vida, no entanto, apresentam-se dialeticamente como propícias para que o ser humano desenvolva tais qualidades ou as ignore. Difícil, não? Ora, se é tão difícil, o caminho da descrença e do materialismo são os mais atraentes. Nele não há culpa. “Eu faço o que eu quiser”, “Não quero ser perfeito”. São esterilizantes para o progresso do indivíduo, no entanto lhes dão uma incrível liberdade de agir. Podem atravessar a estrada da vida como um trator, atropelando qualquer coisa de substrato mais emocional. Pessoas assim não conhecem culpa, remorso e vivem numa aparente calmaria. Vai saber não é?
De outro modo, porém, para aqueles que acreditam que a felicidade só será merecida mediante um esforço sobre-humano, a coisa se complica de fato. São pessoas geralmente “melhores” do que a grande maioria, no que diz respeito às suas atitudes diante das pessoas e do mundo. Pautam suas ações e suas palavras por crenças superiores. Mas como as características intrínsecas do ser humano jamais podem ser totalmente negadas, vivem em eterno conflito e lutam interiormente contra os monstrinhos daquilo que sabem errado. Alguém poderá dizer que certo e errado são conceitos relativos. Uma boa retórica com certeza convence uma mente sem culpas. No entanto, qualquer pessoa que tenha um mínimo conhecimento de coisas que vão além do que se vê, sabe que certo e errado podem até ser relativizados de acordo com o contexto, mas jamais podem ser abstratos. Certo e errado são conceitos reais.
Diante de tudo isso, qual o caminho para a felicidade?
Juro que não sei, pois se soubesse, escreveria um livro e ficaria rica. Mas afirmo que essa pergunta não cala dentro de mim. E creio que não sou a única. Todo mundo deseja ser feliz. E não é uma tarefa fácil. Infelizmente sou obrigada a admitir que dá trabalho.
Com certeza você se sentiu feliz quando abandonou a vida infantil e pôde assumir a responsabilidade por suas escolhas. Certamente ficou muito feliz quando encontrou um grande amor. Certamente você ficou muito feliz com a compra da sua casa, do seu carro. Certamente ficou feliz quando junto com a aposentadoria veio a promessa de uma vida tranqüila que enfim você iria aproveitar. Porém, você também sentiu medos, angústias, decepções quando saiu do casulo da infância para adentrar o complexo mundo adulto. Aquele grande amor podia até ser grande, mas não foi eterno. Ou dura até hoje, mas há discussões, momentos difíceis e vontade de jogar tudo para o alto de vez em quando. Ter sua casa é algo maravilhoso, mas às vezes você reclama do espaço, da localização, ou de qualquer outra coisa que lhe faça esquecer o quanto você a desejou. O carro que você sempre quis, e que te dá conforto e liberdade, obriga você a enfrentar um trânsito louco todos os dias.
O lugar em que quero chegar com todas essa digressões é que é muito importante respeitar seus limites e valorizar suas conquistas. Sempre haverá novos degraus a subir em termos de conquistas materiais. Isso é saudável e produtivo. Faz as pessoas avançarem cada vez mais. No entanto, se não parar um pouco em cada degrau para apreciar o que conquistou, tudo terá sido em vão. Curtir a conquista é fundamental. E pode ter certeza, é o que dá um gosto especial a cada vitória.
Mas não é só isso. Você pode olhar para sua vida e admitir que já caminhou um bocado, que evoluiu alguma coisa, que aprendeu como ser humano e que se esforça, verdadeiramente, para ser alguém melhor todos os dias. Ah, mas isso não basta. Quando assombrado por qualquer monstrinho humano (sim, você é humano!) de raiva, mágoa, vaidade, egoísmo ou qualquer outro, você se sente um profundo fracasso. Afinal, como você pode ter pensamentos e comportamentos dessa natureza? Se continuar assim, não vai conquistar a tão sonhada felicidade, pois não a merece. Isso tudo é um desgaste muito grande. Como uma pessoa pode ter paz se a felicidade se coloca à sua frente como uma miragem? Você se sente próximo, sente que pode alcançá-la, mas não chega lá. Não é nada reconfortante, nem motivador, não é mesmo?
Ser uma pessoa melhor a cada dia deve ser perseguido por todo ser humano. No entanto se você achar que não é digno de ser feliz nesse momento porque possui defeitos como todo mundo, nunca experimentará uma paz verdadeira e, portanto, a felicidade. Não é possível ser feliz em meio a autocobranças ostensivas e ideais distantes. Mas é possível ter momentos felizes quando nos permitimos vivenciar um dia de cada vez e nos aceitamos como somos. Por favor, nada de “eu sou assim e pronto”. Só o amadurecimento pode trazer qualquer coisa de real na sua vida. É necessário sim nos lapidarmos. É necessário sim estarmos cientes de nossos defeitos, mas é necessário também estarmos cientes de nossas virtudes. A consciência daquilo que precisamos melhorar é a matéria-prima com a qual trabalharemos dia-a-dia. A consciência de nossas virtudes é o que vai nos permitir experimentar a beleza da vida e doses de felicidade. Com bom senso, humildade e sabedoria, creio que o caminho se torna menos difícil. Alguém disse que era fácil?

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1 Comentários:

  • De fato, perseguir a felicidade, tal qual nos moldes que você citou, é um dos problemas que os humanos já enfrentam há muitas gerações, sempre partindo de um certo pressuposto de consumir para ser feliz. Esse conceito é bastante massacrante, porque ele nunca se encerra, e de fato não somos ensinados, nem orientados, a perceber quando os brevíssimos momentos de felicidade chegam. Ser feliz virou moda, clichê, mas ainda o conceito de hoje, apregoado até em comerciais (de consumo), está bem longe do real, do palpável, isso nos faz pensar sempre que a felicidade está longe, que dá trabalho. Viver, ter saúde, ter amigos, isso não é felicidade. Ter dinheiro e aí sim, viver muuuito bem, pra ter rios de saúde (haja plásticas), muitos amigos, festas badaladas, isso é felicidade. Pense também, quem puder, quem estiver lendo, se não estão pautando as suas vidas por dinheiro, por valores, que são sim importantes, mas meus caros, não são os mais essencias.

    Por Blogger glaucoviktor, Às 21 de novembro de 2008 às 09:34  

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